30/04/2025

Colaboração no mercado AECO – O problema e a solução

Engenharia 3.0

O tema Colaboração está cada vez mais na moda. Por que isso ocorre? Será que é mesmo um mero “modismo” fomentar a colaboração?

Desafio qualquer pessoa a apresentar um só ramo da sociedade que dependa exclusivamente de um único indivíduo. Não tem. Somos seres de conexão e estamos todos interconectados. Vivemos em sociedade. Isso é um fato. Mas o que é uma sociedade? Objetivamente falando, é um agrupamento de seres que convivem em estado gregário e em colaboração mútua. E o que é “gregário”? Que tende a viver em bando. E colaboração mútua? Que beneficie todos os envolvidos.

Se nos organizamos para assim viver, bom seria que essa convivência fosse harmoniosa, pacífica e de benefício para todos... mas vemos no dia a dia que não é bem assim que as coisas funcionam. Não é objetivo do presente texto filosofar sobre o porquê de não ser assim, quem são os culpados ou por qual razão as coisas são como são. O principal objetivo é destacar que a colaboração é importante e pode ser considerada a base sobre a qual todo trabalho bem-sucedido se apoia.

Segundo Martin Luther King Jr, “nós não podemos caminhar sozinhos. E como não podemos caminhar sozinhos, devemos aprender a caminhar juntos”. Já Marie Curie, reflete sobre o sucesso das relações colaborativas: “a colaboração é a chave para o sucesso. Quando trabalhamos juntos, podemos alcançar coisas que nunca seriam possíveis sozinhos”.

Um conceito interessante com origem no budismo tibetano, trata de um tema conhecido como “A Heresia da Separatividade”, que, resumidamente, aplicada ao meio ambiente e às relações humanas, pode ser entendida como a falsa crença de que os seres humanos estão desconectados da natureza e dos outros seres humanos.

Outro conceito interessante é encontrado na África: Ubuntu. Trata-se de um termo das culturas Zulu e Xhosa que significa: “eu só existo porque nós existimos”. Esses povos acreditam que com cooperação e colaboração se alcança a felicidade, pois todos em harmonia são muito mais felizes.

E o que um pastor batista / ativista político, uma bicampeã do Prêmio Nobel, conceitos tibetanos e africanos sobre colaboração têm a ver com Engenharia?

Praticamente, tudo.

Uma definição encontrada no dicionário: colaboração “...é o trabalho feito em comum com uma ou mais pessoas...”. Ou seja, essa é a realidade do nosso mercado.

A filosofia Ubuntu, por exemplo, encontra paralelos no ambiente corporativo, especialmente em equipes de alta performance. Atletas profissionais de diferentes esportes afirmam que o espírito colaborativo é essencial para alcançar resultados extraordinários. Em provas de revezamento, cada atleta depende do desempenho do outro para conquistar a vitória. Esse princípio pode ser aplicado ao mercado AECO, onde a interdependência das equipes e a confiança mútua são fundamentais para o sucesso de qualquer empreendimento.

A colaboração possui diversas camadas. A mais óbvia, é aquela que ocorre no dia a dia de cada grupo. Mas os grupos também colaboram entre si, afinal, é impossível planejar algo que não tenha sido minimamente projetado; assim como é igualmente impossível gerir a operação de um ativo sem este estar devidamente construído. Sim, é óbvio. O que não é, entretanto, tão óbvio assim, é o fato de que a ausência de colaboração verdadeira entre a cadeia produtiva AECO como um todo, gera ineficiências e desperdícios.

Por essa razão, tem-se falado tanto de BIM. Chama a atenção do leigo e do não-iniciado, os modelos paramétricos, as simulações, visualizações 3D e todo encantamento gerado pelo uso de tecnologias de ponta. Mas o grande valor de adotar BIM como base para fazer Engenharia Digital de ponta, reside na possibilidade de colaboração e gestão da informação. Não por acaso, fala-se tanto em classificação da informação e interoperabilidade. Claro! Afinal, é necessário organizar bem a informação para que ela possa fluir sem restrições entre os diversos “players”, independentemente da plataforma em que essa informação será acessada / consultada / utilizada. A adoção da modelagem paramétrica permite que a informação evolua ao longo do tempo: de ideias e conceitos simples, passando para uma informação tão sofisticada quanto se desejar, fluindo de stakeholder para stakeholder, como um bastão é passado no atletismo, na prova de revezamento 4x100m. Mas a colaboração vai além de simplesmente passar a informação de mão em mão.

Em uma visão de Gestão de Projetos, notamos que a integração entre os grupos vai além do simples compartilhamento de informações. Trata-se de criar um ecossistema em que cada parte compreenda sua contribuição para o todo. A mentalidade colaborativa é essencial para evitar silos organizacionais e garantir que as decisões tomadas em uma etapa do processo não prejudiquem as etapas subsequentes. Essa visão holística é o que transforma projetos em verdadeiros sucessos.

Além das vantagens técnicas proporcionadas pelo BIM, sua implementação exige uma mudança cultural nas organizações. Em operações bem-sucedidas de diferentes empresas, percebe-se que essa transformação começa com a valorização das pessoas e do trabalho em equipe. O BIM não é apenas uma ferramenta; ele representa uma filosofia colaborativa que demanda comunicação clara, alinhamento estratégico e confiança entre os stakeholders. Quando bem implementado, pode ser o catalisador para uma revolução na forma como projetamos e construímos.

Embora o BIM seja amplamente reconhecido como uma ferramenta poderosa para promover colaboração no mercado AECO, existem outras metodologias que também colocam a colaboração no centro de suas práticas. Advanced Work Packaging (AWP), Lean Construction e Métodos Ágeis são exemplos que compartilham um princípio comum: a integração e o trabalho conjunto entre todas as partes envolvidas. A essência dessas metodologias não está apenas em suas técnicas específicas, mas na capacidade de criar um ambiente onde os diferentes stakeholders trabalham alinhados em direção a objetivos compartilhados. Independentemente do nome ou da abordagem adotada, o verdadeiro valor reside na mentalidade colaborativa que elimina silos, promove confiança e busca resultados otimizados para todos os envolvidos. O sucesso depende do sincronismo e da harmonia entre os participantes.

Colaboração começa a partir do entendimento de que cada parte que compõe o sistema produtivo, tem sua importância, seu valor e sua necessidade de estar presente no processo. Não dá para ser colaborativo e egocêntrico, são conceitos antagônicos e mutuamente excludentes. Um bom gestor de equipes, promove sinergia, que é  justamente o funcionamento do todo em harmonia. Da mesma maneira, deve assumir como premissa promover as condições para que todos envolvidos possam fazer suas partes e garantir que essas partes se conversem em níveis inteligíveis entre si e atendam o principal beneficiado: o cliente final.

Em última análise, a colaboração não é apenas uma solução para os desafios do mercado AECO; ela é um valor intrínseco que define nossa capacidade de inovar e prosperar. Seja na engenharia, no esporte, ou em qualquer setor, os melhores resultados surgem quando indivíduos trabalham juntos com propósito e sinergia. Como profissionais, devemos abraçar essa mentalidade de campeão, promovendo ambientes colaborativos que impulsionem tanto o desempenho quanto a satisfação dos envolvidos. Apenas deste modo poderemos alcançar o verdadeiro sucesso dos projetos, não porque uma área ou empresa envolvida obteve resultados de acordo com suas metas individuais, mas porque todas as partes alcançaram de fato desempenhos acima da média e de acordo com os objetivos mútuos.

É natural que sempre haverá resistência à mudança e uma certa desconfiança em relação às tecnologias e metodologias de vanguarda. Entretanto, uma vez que os benefícios sejam observados na prática, como uma melhor comunicação, satisfação dos clientes (internos e externos), custos sob controle, retrabalhos evitados e maior sinergia entre os envolvidos; maior será o engajamento às práticas colaborativas.

Talvez o grande desafio dos tempos atuais, seja demonstrar que colaborar é melhor que competir; que não existe relação “ganha-ganha” onde o ego manda; e que a colaboração ao mesmo tempo é o desafio a ser superado e a própria solução em si.